segunda-feira, 24 de novembro de 2008

TRIBUNA DA BAHIA

O LAMPADÁRIO DE DENISE
Ildásio Tavares

Em preconceito favorável, a tenho, não apenas por ser filha de um dos amigos que mais admirei e a quem outorguei o título de Doutor Honoris Causa pela Universidade da Bahia, Alfredo de Freitas Dias Gomes. Sua atividade artística e literária mereceu minha atenção. O INSÓLITO FESTIM é um romance de muita densidade, mostrando a preocupação em agudizar as problemáticas existenciais a um nível de profundidade para delas extrair seu material de ficção - vertical é a palavra que vem ao me debruçar sobre a obra de Denise Emmer- . De grande relevo, sem dúvida, as melodias que ela criou para poemas de Ivan Junqueira, perfeita integração de linguagens.
De cara, LAMPADÁRIO atrai por seu ordenamento, tanto de idéia como de ritmo - Denise aceita o desafio do verso medido que esgrime com perícia, fato raro hoje em dia. Os poetas, ou fogem da métrica tradicional, ou estropiam-na num mal uso total. A poetisa tem claro domínio da métrica e escolhe os metros com adequação aos temas. Na genealogia do absurdo, é a redondilha com uma rima errática que a poetisa escolheu:

Minha mãe anda distante
Meu pai a leva nos braços
Avisto lençois no espaço
Os avós já vão mais longe

Em um traço conservador, Denise opta por maiuscular todo início de verso. Em um traço avançado, pontua erraticamente.
É de se destacar, todavia, a preferência que Denise mostra em todo seu livro por uma poética de pensamento. Ora perquirindo o cerne das coisas; ora repassando a vida de uma tênue ironia, esta autora parece seguir a trilha de Fernando Pessoa e dizer o que em mim sente está pensando - o agudo sentimento de existir jamais recebe dela uma capa de sentimentalisno piegas. Muito pelo contrário - e até se nota a influência denunciada de Dylan Thomas - a autora embola e enrola o material da vida que, muito apropriadamente, transforma em poesia pela alquimia da perfeita verbalização.

Vejo o Theatro sua platéia plena
As frisas, os balcões, o céu suas moradas
Um anjo me aguarda e sopra as partituras
Frases escuras de récitas lendárias

Nestes versos a poetisa denuncia logo sua intenção alegorizante ao transcrever theatro em grafia arcaizante. Avisa logo ao leitor que não fala de uma sala de espetáculos comum mas sim do espetáculo do mundo que se compraz em emoldurar para consumo imediato. No fundo é uma alegoria só, LAMPADÁRIO, tecida em seus mosaicos interiores.
Denise corta e recorta e dispõe para o leitor seu jogo de armar que, de muitas luzes compõe-se seu LAMPADÁRIO, no escuro do nosso tempo.

Ildásio Tavares é poeta, crítico e doutor em literatura.

Um comentário:

Mário Sérgio de Brito Duarte disse...

Denise Emmer
Conversávamos hoje, eu minha mulher, sobre uma música que havia marcado nossas vidas: eu,já com meus vinte e um anos e ela ainda com seus oito.
Hoje, encontramos você e "Alouette".
Você não sabe a nossa alegria.
Lemos suas poesias (e nos entristecemos um pouco), vimos sua história e nos felicitamos bastante.
Receba nossa emoção, com trinta anos de atraso, num forte abraço.
Mário Sérgio e Viviane Duarte