terça-feira, 23 de dezembro de 2008

A CHAMA SECRETA


Apareço nesta noite como um sol de asas
Venho dos pólos desmaiados e das florestas em brasa
Quando ardo sou uma espécie que agoniza
Quando sorrio é porque a grande árvore floresce

Anunciam-me os reis guardados e estamos num gueto
Mulheres descalças de seios de vento me embalam
Sou o beijo que elas já não pedem
O calor de seus ventres sem enredo
A cidade sonhada, o país estrelado, o lar aquecido,
O primeiro e o último filho

Sou a lanterna do cão sem olhos

Novos livros me inventam, revoluções me transformam
Mas passo pelos corredores do mar
Como um navio eterno
E a minha linguagem é a beleza das estrelas
Que atravessa os séculos

Sou o menino sagrado que riscou o céu
Para a paz sem riscos


... a chama secreta que acenderá as lareiras
das casas do inverno.

domingo, 14 de dezembro de 2008


B A L A D A P A R A U M F A N T A SMA

Teus olhos vitrais de inverno
Desnudam meu corpo em vôo
Estás distante és tão terno
Se te aproximas eu morro
Ao ver-te longe e isento
De pé sobre um muro frágil
Consigo amar-te em silêncio
Porquanto ainda és miragem

Se vens como tempestade
Para açoitar meu vestido
Não virás como o amigo
Mas como as ervas daninhas
Não me cante ladainhas
Faça-me sinfonias
Abraços em profundezas
Cantos de noite fria
E se por hora és momento
Acúleo, praias de cruz
Tua mão não me conduz
Se não te alcanço, te invento

No lugar de tua pedra
Estendo uma nuvem parda
Ordeno um céu de baladas
Para acordar teu fantasma
Giro a lua em seis dragões
Para dizer-te segredos
Rabisco novos enredos
Em tua floresta pálida

Viro páginas de insônia
Tentando escrever-te estrelas
Alimento o cão vazio
Que dorme em tua soleira
.

sábado, 6 de dezembro de 2008

ANTES D0 PRINCÍPIO
Para Arthur

Antes do princípio era uma casa sem portas.

O mar deitava-se como um cão de guarda
E esperava o mundo, seu primeiro cérebro

Deus não tinha patas, nem chifres, nem seios
Era um pulmão fechado numa caixa sem sangue

Então nada existia nem os vermes das estrelas
Nem a luz, nem as trevas, só olhos esporádicos

Antes do antes ainda sem presságios
Um mapa escrito por santos do futuro:

Um frágil muro qual linha obscura
A separar o verbo das portas da loucura.